Short story in Portuguese for advanced learners
Olá!
Bem vindos ao episódio 60 do Portuguese Lab Podcast.
This episode is a short story for advanced learners. It’s based on a true story about two kids from a village in the mountains, stealing figs from a fig tree, and encountering a witch.
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Text
Numa fresca manhã da serra, dois rapazes duma pequena aldeia atravessaram o adro da igreja ainda fechada.
Os pássaros ainda estavam a despertar na copa das árvores que ladeavam a fonte de água que vinha direta da nascente. Um dos rapazes abriu a torneira e, com as mãos em concha, deu um grande golo de água.
“Ui, que fria!” disse ele, esfregando rapidamente as mãos uma na outra.
“Vamos, pela quelha!” disse Rui, o mais novo.
Entraram na quelha depois da casa do ferreiro e subiram em zigue zague até chegarem ao muro que separava o caminho da propriedade do conde. Treparam o muro e saltaram para o outro lado.
“Au!” gritou o Luís. “Já pus a mão em cheio em cima de uma urtiga.”
O Rui riu-se enquanto se enfiava debaixo dos ramos de uma grande figueira. No lusco-fusco do interior da figueira viam-se, pendurados, os frutos em forma de gota.
“Hmm, os figos estão mesmo grandes.” disse o Rui. “Abre aí o saco.”
Enquanto um dos rapazes abria um figo suculento, o outro ia apanhando-os e deixando-os cair dentro do saco.
“Chiu! Ouviste aquilo?”
“Não ouvi nada. De que é que estás a falar?” perguntou o Luís.
Olharam os dois por entre os ramos para o exterior, onde o dia ainda estava a clarear.
“Ali, do outro lado da quelha. Pareceu-me ouvir um grito.” disse o Rui.
Além do muro, do outro lado da quelha, numa pequena elevação, erguia-se uma oliveira centenária, negra e de ramos despidos.
“Vamos lá ver.” sugeriu o Rui.
“Nem pensar! Aquela não é a oliveira amaldiçoada?” perguntou o Luís.
“Não digas disparates. Lá porque uma oliveira ardeu duas ou três vezes, não quer dizer que esteja amaldiçoada.”
Os dois rapazes pousaram o saco de figos em cima do muro e aproximaram-se pé ante pé da oliveira. Na base da árvore, onde grandes raízes formavam uma reentrância estava um vulto de costas, agachado.
“Ai, ó Rui, vamos embora.” sussurrou o Luís.
“Deixa de ser maricas!” disse o Rui.
“Não sei porque é que ainda te dou ouvidos…” disse o Luís.
O vulto, todo vestido de negro, estava a entoar uma cantilena quando parou repentinamente, ficando em silêncio absoluto.
Os rapazes, apercebendo-se de que tinham sido descobertos, ficaram imóveis. Por breves momentos só se ouviu um rego de água a passar ali perto.
O vulto, uma velha de lenço negro na cabeça e nariz adunco, rodou rapidamente sobre os calcanhares e lançou-lhes um olhar furioso.
“O que fazeis aqui?”
Um dos rapazes ainda conseguiu balbuciar: “ Nós...” mas parou ao ver que a velha tinha numa das suas mãos uma pena de corvo.
“É uma bruxa, Rui! Foge!” gritou o Luís.
“Bem que podeis tentar fugir para vossa casa, minhas pestes.” grasnou a velha. “Já estais sob o feitiço que acabei de vos lançar!”
Um dos rapazes agarrou o outro pelo braço e foram os dois aos tropeções pela quelha abaixo, sem olhar para trás.
A velha ainda os observou durante um pouco até desaparecerem de vista. Depois foi até ao muro, agarrou no saco de figos e continuou a subir a quelha.